Por suas propriedades químicas, os medicamentos são produtos que precisam de um extremo cuidado na hora do descarte. É neste ponto que uma logística reversa voltada à área de saúde feita de forma correta torna-se essencial.

Para entender mais sobre o cenário do descarte de medicamentos no Brasil, conversamos com Bárbara Guelfi, fundadora e CEO da Kivalita Consulting. Vamos conferir? Continue lendo para saber mais!

O que é e como funciona a logística reversa na saúde? 

Bárbara Guelfi:  Ainda são muitas as dúvidas que acompanham o tema sobre a logística reversa de medicamentos no Brasil. A questão fica ainda mais complexa, quando as empresas nos procuram para saber quem e como esses medicamentos devem ser armazenados até a destinação final. 

Para elucidar, primeiramente devemos observar a legislação aplicável aos resíduos, que foi instituída no Brasil há pouco mais de uma década, sendo a logística reversa parte da Política Nacional de Resíduos (PNRS). Após ser sancionada, vários decretos (como por exemplo,  os Decretos nº 7.404/2010 e o nº 9.177/17) entraram em vigor para tratar a questão da destinação correta de resíduos de medicamentos. Adicionalmente, para o Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS) há a Resolução RDC nº 222/2018 (publicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Anvisa) e a Resolução nº 358/2005 (publicada pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente, Conama). Este, o PGRSS é obrigatório para todas as empresas que gerem ou manipulem tais resíduos (como, por exemplo, importadoras e distribuidoras, farmácias e drogarias, clínicas de acupuntura, etc). 

Dez anos depois, só no último ano, o governo brasileiro finalmente firmou uma parceria com o Ministério do Meio Ambiente e sancionou o Decreto nº 10.388, que aborda a logística reversa de medicamentos e determina que os consumidores descartem seus medicamentos em desuso, descontinuados ou vencidos e suas embalagens em pontos de coleta específicos para este fins, nas farmácias e drogarias.

O descarte inadequado de medicamentos vencidos ou não mais utilizados pela população traz riscos de contaminação do solo e dos rios subterrâneos. Devemos aqui considerar descarte inadequado não somente o descarte nas ruas ou rios, mas também no lixo comum, onde tais medicamentos seriam destinados a aterros sanitários. Medicamentos psicotrópicos, antibióticos ou hormonais não devem, jamais, serem descartados pelos usuários em lixo comum ou mesmo no esgoto doméstico, pois o sistema de esgoto que há nas residências não está preparado para eliminar totalmente as substâncias desses medicamentos, podendo gerar grandes danos ao nosso meio ambiente. 

Quais os desafios da logística de medicamentos no Brasil?

Bárbara Guelfi: Muitos ainda são os desafios da logística de medicamentos no país. Dentre eles:

  • Ampliação dos pontos de coleta de medicamentos. O decreto n° 10.388 determina que a logística reversa seja feita em pontos de coleta de medicamentos em farmácias de capitais de estados e municípios, porém, com mais de 500 mil pessoas. Demais adesões podem ocorrer de maneira opcional, desde que o setor garanta um ponto de coleta em local visível, com um dispensador e com saco plástico, para cada 10 mil habitantes. Além disso, a farmácia ou drogaria deve arcar com os custos deste dispensador a ser adquirido – de acordo com o que determinar o INMETRO – ou, se for o caso, pode-se fazer parcerias promocionais com fabricantes de embalagens.
  • Disseminação da conscientização quanto ao descarte correto de medicamentos junto à população é extremamente essencial.
  • Implementação de leis adequadas que considerem um modelo de logística reversa com custo viável, considerando gastos operacionais e custos com locais para a destruição dos medicamentos vencidos e em desuso. A destinação para incineração ainda tem custo elevado a qualquer empresa, o que promove ainda mais a negligência de algumas empresas sobre o assunto.

Como funciona a logística reversa no descarte de medicamentos?

Bárbara Guelfi: Primeiramente o consumidor, consciente e comprometido com as questões ambientais, realiza o descarte correto do medicamento vencido ou sem uso em algum dos pontos de coleta nas farmácias e drogarias em todo o Brasil. Os sacos com esses medicamentos vencidos ou em desuso devem ser lacrados, pesados e etiquetados, bem como armazenados por um tempo determinado até que sejam retirados pela distribuidora, a qual retornará tais produtos devolvidos para seus fabricantes originais. Tais empresas devem realizar a identificação, armazenagem e destinação correta conforme a classificação dos resíduos recebidos (RDC 222/2018).

Os dados sobre a lacração e o peso dos sacos, com os medicamentos a serem descartados, devem ser informados no GAP – Grupo de Acompanhamento e Performance.

Logo após, cada fabricante fica responsável pelo descarte do medicamento em um local ambientalmente correto para sua destruição, por meio de incineradores, coprocessadores ou lixão de grau 1 devidamente homologado por entidades ambientais.

Apesar de ser de responsabilidade dos fabricantes a destinação final dos medicamentos vencidos ou em desuso, toda a cadeia de distribuição, armazenagem e dispensação devem atuar também para garantir a destinação adequada destes resíduos.

Qual a importância da logística reversa no descarte de medicamentos?

Bárbara Guelfi: Ao colaborar para o descarte correto de medicamentos, o consumidor está apoiando iniciativas globais de proteção ambiental, garantindo que os recursos naturais sejam preservados. 

Para se ter uma ideia, as estatísticas revelam que 1 kg de medicamento descartado no esgoto pode contaminar até 450 mil litros de água, sem contar os impactos irreversíveis no ambiente por medicamentos de classes específicas como hormonais, antibióticos e psicotrópicos. Adicionalmente, as substâncias altamente tóxicas provenientes da destruição de medicamentos descartados incorretamente em lixo comum, podem colocar em risco as pessoas que trabalham na coleta de resíduos comuns, como os garis. 

Até mesmo a incineração de medicamentos requer validação do fornecedor e treinamento de suas equipes, para não comprometer a vida dos profissionais que atuam nesse setor, ou seja, não expondo-os a gases com substâncias altamente tóxicas.

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