A ligação entre diferentes regiões do país por trens é um dos grandes temas do setor ferroviário em anos recentes. O assunto foi um dos destaques do NT Expo 2023, recentemente realizado na capital paulista.
Com o título “Trens regionais como solução de integração e mobilidade”, um dos debates do evento contou com participantes de peso para falarem do assunto.
Mediado por Vicente Abate, presidente da ABIFER – Associação Brasileira da Indústria Ferroviária, o painel reuniu os seguintes profissionais:
- Philippe Citroën, diretor-geral da UNIFE – The European Rail Supply Industry Association;
- Jean Pejo, executivo da ALAF – Associação Latinoamericana de Estradas de Ferro;
- José Villafañe, secretário-geral da ALAF; e
- Massimo Giavina, vice-presidente do SIMEFRE – Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários.
Veja abaixo os principais pontos abordados no encontro!
Exemplo europeu: experiência internacional em trens regionais
Referência em trens regionais, a Europa foi representada por Philippe Citroën, que falou por videoconferência direto da Bélgica e contou mais sobre o avanço da indústria e do transporte de trens nos países da União Européia (UE).
“As prioridades da UNIFE na indústria são, primeiro, a qualidade. Também as habilidades, pois em todos os lugares do mundo existe um déficit de engenheiros, e esperamos que as universidades, incluindo da América Latina, estejam buscando essa formação, pois precisaremos de cada vez mais profissionais”, refletiu.
Citroën citou ainda a colaboração entre os continentes como chaves para este novo cenário dos trens regionais na América Latina, indicando iniciativas europeias que visam estreitar os laços e fomentar o crescimento da área.
Segundo o representante da UNIFE, atualmente o segmento ferroviário transporta 17% da carga terrestre e 8% dos passageiros que se locomovem no continente. Em sua visão, esta experiência pode ser válida também para a América do Sul.
“Na Europa nós criamos uma rede de transportes da UE que está baseada no foco de intercâmbio que será completado em 2030, 2040 e 2050. Isso é interessante para analisarmos os requisitos de infraestrutura e para a construção de plataformas”, destacou ele.
Trens movidos à hidrogênio verde: realidade cada vez mais presente
Outro ponto comentado no painel foi o uso de trens movidos a hidrogênio verde e outras tecnologias sustentáveis. Segundo Citroën, a Europa já conta atualmente com 55% de suas ferrovias eletrificadas, o que deve seguir avançando.
Prosseguindo o bate-papo, Jean Pejo começou sua participação explicando que a questão dos trens regionais são um grande desafio para o Brasil, observando que há 20 anos o país não tem operação de trens de passageiros nesta escala.
“Nós já demos o primeiro passo com o regime de autorização, que é mais simplificado para que se possa ser desenvolvida novas ferrovias, seja para passageiros ou para cargas, e já é um início para começarmos a discutir e desenvolver os trens regionais”, disse ele.
Ainda segundo Pejo, o país tem qualidade técnica para que sejam construídas novas ferrovias de menor escala, ao contrário do cenário atual, em que os investimentos têm sido realizados majoritariamente para trens de grande porte, como os que transportam minério de ferro e outras cargas vultosas.
“Existem muitas cargas regionais que poderiam muito bem ser transportadas por ferrovias mais simples, com características totalmente diferentes das ferrovias heavy roll, com capex mais baixo, e que permitem inclusive um ambiente de negócio favorável para elas”, analisou.
De acordo com o representante brasileiro da ALAF, mais do que pensar nos trens que conectam regiões metropolitanas, como o que ligará São Paulo à Campinas, é preciso idealizar linhas que englobam áreas com menos habitantes.
Abate, por sua vez, revelou que entidades ferroviárias se reuniram recentemente com Renan Filho, Ministro dos Transportes do Brasil, com quem foi debatido o tema da Política Nacional de Transporte de Passageiros, que pode dar suporte a esses trens regionais de média distância em diversas regiões do Brasil.
Eficiência energética: descarbonização e sustentabilidade
Também participando por videoconferência de Buenos Aires, José Villafañe abriu sua fala destacando que este olhar para os trens regionais marcará uma fase importante para toda a América Latina.
“Temos dado muita importância à questão ambiental, buscando estruturar tudo da maneira possível, e as locomotivas de hidrogênio são uma possibilidade. Ainda estamos um pouco distantes, temos a questão da eletrificação, mas estamos projetando e pensando nesse tema”, relatou.
Dando o exemplo do trabalho realizado em seu país, Villafañe falou sobre a ação feita primeiramente em Buenos Aires, com a melhoria do transporte urbano na metrópole, partindo então para a retomada dos trens em outras regiões argentinas.
“Já estamos em processo definitivo de eletrificação. Depois, decidimos pela recuperação dos trens regionais, que no princípio nos deram muito trabalho pelo estado de abandono que tinham. E, pelo esforço do ministério, secretarias e demais entidades do sistema ferroviário, tivemos um avanço bastante otimista”, disse.
A capacidade da indústria brasileira para os trens regionais
Massimo Giavina iniciou sua participação relembrando que o país está realizando muitos investimentos e modernização nos vagões, apontando que o Brasil possui os maiores vagões-tanque do mundo, o que indica maior produtividade.
“Já temos locomotivas com baterias, e inclusive exportando para os EUA. Falando sobre trens regionais, nossa indústria já está adquirindo a capacidade técnica e fabricando tais trens, com toda condição de atender o nível brasileiro com produção 100% nacional”, relatou ele.
Giavina reforçou a necessidade de que o país invista na fabricação de peças de manutenção, indicando que a política industrial por parte do governo pode auxiliar a aquecer a indústria brasileira ao invés de importar do exterior.
“O trem de velocidade Rio de Janeiro-São Paulo é um dos melhores do mundo. Estamos falando de duas metrópoles, então como não temos uma ligação semelhante à que existe entre Paris e Lyon? A indústria está capacitada para fazer esse trem, e vamos tirar esse viés político”, comentou.
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