Mesmo apresentando grande potencial logístico, as ferrovias no Brasil ainda são pouco utilizadas pelo governo e por empresas privadas. Segundo a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), o modal só corresponde a 15% de todo o transporte de carga do país

O baixo investimento nas linhas férreas é sempre um ponto de discussão em palestras, reuniões e eventos logísticos.

Investidores e profissionais do mercado questionam  os motivos do Brasil ter uma malha ferroviária tão aquém de suas possibilidades em termos territoriais, e como mudar esse panorama em prol do avanço logístico nacional. 

Por que, quando falamos de transporte ferroviário, nosso país continua tão atrás em relação a outras nações de dimensões e economias semelhantes? O que pode ser feito para melhorar a situação das ferrovias no Brasil? Quais são os benefícios logísticos dessas melhorias? 

Para entender mais sobre esses e outros questionamentos, continue a leitura!

Por que o Brasil tem uma malha ferroviária menor do que as de outros países de dimensões semelhantes? 

Como mencionamos anteriormente, o alcance das ferrovias no Brasil ainda é irrisório quando considerarmos o tamanho de nosso país. 

A extensão total da nossa malha atual é de 29 mil km. Os Estados Unidos, por exemplo, contam com mais de 295 mil km de linha férrea, ficando em primeiro lugar no mundo. 

Também ficamos muito atrás em comparação com países europeus de grandes dimensões. Na Rússia, que também tem proporções continentais, o modal ferroviário corresponde a 81% de toda a carga de transportes do país. 

Mas por que isso acontece? Por que a malha ferroviária no Brasil é tão pequena? As respostas podem ser encontradas na história do transporte nacional. 

A construção de ferrovias no Brasil

A construção de ferrovias no Brasil começou no século XIX, com a primeira linha sendo inaugurada no Rio de Janeiro, em 1854. 

Naquela época, havia o entendimento de que o modal ferroviário era uma das melhores opções, tanto para o transporte de passageiros quanto para a movimentação de cargas. A expansão continuou até a segunda década do século XX. 

Os investimentos começaram a diminuir a partir do governo do presidente Washington Luís, em 1930. Sendo um incentivador assumido do transporte rodoviário, ele focou na construção de estradas e preteriu a continuidade da malha ferroviária.

Alguns de seus sucessores, como Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek, seguiram pelo mesmo caminho. 

Na época, as montadoras de automóveis começavam a chegar ao Brasil, e os presidentes enxergavam na construção de novas rodovias o melhor incentivo para trazer outras empresas. 

Todavia, foi entre as décadas de 60 e 80, durante o regime militar, que a malha ferroviária foi praticamente desconsiderada. Os militares acreditavam que o investimento nas ferrovias no Brasil era desnecessário; então, cortaram gastos e priorizaram somente o modal rodoviário

Sobre essa questão, Ricardo Largman, responsável pela assessoria de imprensa da ANTF, lembra que até mesmo as empresas privadas sofreram com o descaso: 

É notório os estímulos à construção de rodovias e ao modal rodoviário por governos anteriores, o que resultou numa malha bastante sucateada, ineficiente e, em muitos casos, totalmente inútil à época da privatização [1997], quando as concessionárias começaram suas operações”, aponta.

Obstáculos para o desenvolvimento das ferrovias no Brasil

O Brasil enfrenta desafios significativos para o desenvolvimento do setor ferroviário, reflexo de problemas estruturais, econômicos e de escolhas históricas que priorizaram outros modais de transporte. 

Segundo o Plano Nacional de Logística (PNL), em 2015 o transporte rodoviário representava cerca de 65% da matriz de transportes, enquanto os modais ferroviário e aquaviário, ambos mais eficientes, tinham participação de apenas 15% cada. 

Esse desequilíbrio compromete o aproveitamento das vantagens oferecidas pelas ferrovias, como maior capacidade de carga e menores custos operacionais em longas distâncias.

Limitações na infraestrutura ferroviária 

A infraestrutura ferroviária nacional apresenta gargalos que dificultam sua expansão e eficiência. 

Grande parte da malha ferroviária brasileira é antiga e pouco adaptada às demandas atuais. Linhas mal conservadas, sistemas obsoletos e trechos incompletos são obstáculos recorrentes. 

Há falta de conectividade entre as ferrovias e outros modais, como portos e rodovias, o que compromete a eficiência do transporte intermodal. 

A ausência de corredores logísticos integrados eleva custos, reduz a competitividade das ferrovias e limita seu uso para transporte de cargas em larga escala.

Desafios econômicos e políticos

Os desafios econômicos e políticos também contribuem para o atraso no desenvolvimento ferroviário

Historicamente, o Brasil priorizou o transporte rodoviário, recebendo maiores investimentos em infraestrutura, enquanto o setor ferroviário foi deixado em segundo plano. Essa política gerou uma dependência econômica de rodovias e caminhões.

O investimento necessário para expandir e modernizar as ferrovias é alto e de retorno a longo prazo, o que desestimula o interesse de investidores privados. 

Outro ponto é a ausência de um planejamento estratégico integrado entre União, estados e municípios, além de entraves burocráticos e instabilidade regulatória que comprometem a viabilização de projetos ferroviários.

Competição com outros modais 

A forte predominância do transporte rodoviário no Brasil cria barreiras adicionais para o crescimento do modal ferroviário. 

Mesmo sendo mais eficiente para o transporte de cargas de grande volume em longas distâncias, as ferrovias disputam espaço com caminhões que, historicamente, foram favorecidos por políticas públicas e investimentos.

Além disso, o modal aquaviário, que também detém cerca de 15% da matriz de transportes (PNL, 2015), compete com as ferrovias na exportação de commodities, como grãos e minérios, em regiões próximas a portos. 

Essa concorrência reflete a ausência de uma política de integração intermodal, que poderia reduzir custos e ampliar a eficiência logística nacional.

Relacionado: Ferrovias e sua vitalidade para o transporte de cargas nacional

O que pode ser feito para melhorar o transporte ferroviário no Brasil? 

A resposta óbvia para essa pergunta é: continuar os investimentos iniciados no século XIX. Mas isso é algo que todos sabem desde aquela época, e nem por isso houve grandes melhorias nas ferrovias do Brasil. 

A melhoria da malha ferroviária brasileira depende, em grande parte, de investimentos do Governo Federal, incentivos estaduais e municipais, além da atuação do setor privado para impulsionar o modal ferroviário. No entanto, essas iniciativas precisam ser conduzidas com cautela.

É necessário um projeto que identifique os traçados conectando polos de produção nacional aos portos. Algumas dessas linhas já existem, demandando apenas reformas, enquanto outros trechos precisarão da criação de novas linhas ou de ampliações significativas.

O segundo passo do investimento seria focar na construção de uma malha ferroviária que atravesse o Brasil de norte a sul, passando pelo interior

Essa conexão impulsionaria definitivamente o modal ferroviário no país, permitindo o cruzamento de rotas mais complexas para o modal rodoviário de forma mais ágil e econômica.

Contudo, a participação do governo não se resume ao investimento financeiro. Ainda de acordo com Largman, o Estado tem como melhorar essa situação estimulando a iniciativa privada: 

De fato, o grande instrumento que o Governo Federal tem em mãos para estimular os investimentos por parte das concessionárias é o programa de prorrogação antecipada dos contratos de concessão.

A iminente assinatura do termo aditivo de prorrogação da Malha Paulista permitirá a aplicação de cerca de R$ 7 bilhões nos próximos cinco anos”. 

Relacionado: Tecnologia blockchain nas ferrovias e sua contribuição para o modal

Como a expansão das ferrovias no Brasil pode contribuir com o setor logístico? 

Expansão ferroviária como solução logística

A expansão ferroviária no Brasil pode reduzir custos logísticos, aumentar a competitividade no mercado externo e atrair investimentos privados, além de gerar empregos e impulsionar o crescimento econômico. 

Por ser mais eficiente em longas distâncias, o modal ferroviário é estratégico para o escoamento de grandes volumes de carga.

As ferrovias contribuem para a sustentabilidade, emitindo menos gases poluentes e preservando as rodovias, reduzindo o desgaste e os custos de manutenção. 

Com alta capacidade de transporte, elas aliviam o tráfego rodoviário, diminuindo acidentes e gargalos logísticos, fortalecendo uma logística mais eficiente e ambientalmente responsável.

Conexão intermodal

A integração intermodal, que combina ferrovias, rodovias, hidrovias e portos, permite reduzir custos logísticos, como fretes e combustíveis, ao utilizar cada modal com base nas características das cargas e nas distâncias.

Além de facilitar o escoamento de mercadorias destinadas à exportação, como grãos e minerais, promove maior sustentabilidade, reduzindo a emissão de gases de efeito estufa.

Um exemplo de avanço na intermodalidade brasileira é a Ferrovia Norte-Sul, que conecta regiões produtivas a portos estratégicos, melhorando o transporte de grãos e minerais. 

Para maximizar esses benefícios, é necessário ampliar as conexões intermodais, expandindo a malha ferroviária para outras regiões e fortalecendo o planejamento logístico nacional.

Exemplos de sucesso em outros países

Modelos ferroviários de países como Estados Unidos, China, Alemanha e Rússia podem servir de inspiração para o Brasil. 

Os EUA, com 295 mil km de trilhos, priorizam cargas pesadas e longas distâncias por meio de empresas privadas altamente eficientes, apontando a necessidade de o Brasil estimular parcerias público-privadas no setor. 

Já a China investe em ferrovias de alta capacidade conectando áreas produtivas a portos, destacando a importância de projetos estratégicos para exportação e integração intermodal no Brasil.

A Alemanha demonstra como a modernização contínua e a integração com outros modais, como rodovias e hidrovias, aumentam a eficiência logística, enquanto a Rússia, com 81% de suas cargas transportadas por ferrovias, mostra o valor de uma ampla malha conectando regiões remotas. 

Quais são os benefícios de uma integração das ferrovias com os outros modais? 

Com uma perfeita integração entre os modais rodoviário, ferroviário e aquaviário, todos os agentes envolvidos na cadeia logística tendem a se beneficiar com serviços de maior qualidade e custos reduzidos. 

Por exemplo: muitos caminhões precisam fazer várias viagens para movimentar cargas mais extensas. Isso seria otimizado se as ferrovias no Brasil recebessem melhorias.

Como um vagão de trem suporta muito mais peso que um caminhão, seria possível transportar tipos específicos de carga em uma única viagem de trem.

Assim, sempre que precisar transportar um volume grande, a empresa poderia optar pela malha ferroviária ou pela integração com os outros modais, selecionando as rotas e possibilidades que mais se adequam às suas necessidades.

Além da escolha do modal mais apropriado para cada situação, a expansão férrea traz outras vantagens, entre elas: 

  • Redução de custos; 
  • Diminuição da emissão de poluentes; 
  • Redução de acidentes nas estradas. 

Desta forma, podemos verificar que o investimento nas ferrovias no Brasil é uma iniciativa que só traz benefícios para o país, para as empresas e para os usuários em geral. 

Assim, mesmo com décadas de atraso, também poderíamos colher bons frutos com a expansão de nossa malha, desde que feita de maneira inteligente e planejada.

Leia também: Inteligência Artificial nos trilhos: primeiros testes com IA nas ferrovias

Para continuar aprendendo sobre o desenvolvimento e as oportunidades nas ferrovias no Brasil, não perca a Intermodal South America 2025, onde o futuro da logística ferroviária e as inovações no setor serão discutidos por especialistas do Brasil e do mundo. Garanta sua participação!